16 Meu primeiro contato com a produção artística de Mil- ton Kurtz foi através de uma mediação. Éramos eu, a mediadora, uma gravura sem título e inúmeras leituras possíveis, perpassando as cores fortes utilizadas na com- posição até a tensão representada nos rostos das figu- ras humanas que formavam a imagem; era dramático e colorido! Foi só algum tempo depois que aprendi sobre os diálogos de Kurtz com a Pop Art, sobre seu uso de fotografias como referências para desenhos, sobre sua participação no Grupo KVHR e sobre as diversas fases de seu trabalho; informações pertinentes para analisarmos e reconhecermos a importância de sua carreira, mas, em meu entendimento, secundárias, caso o objetivo seja observar e criar novas relações com as imagens produ- zidas por Kurtz. A serigrafia, a qual dedico este texto, possui todos os elementos que observei na experiência descrita acima: ausência de título, cores vibrantes e figuras com rostos expressivos. Neste momento, enquanto estamos diante desses dois personagens, eu poderia iniciar um exercí- cio formal e indicar alguns elementos que compõem a imagem, como a xícara e o brinco igualmente verdes, as roupas em tonalidades diferentes de azul ou o vapor SEM TÍTULO , 1985 | Serigrafia | 47,5 x 65,5 cm rosa que sai da xícara e que também envolve a figura de cabelo amarelo; outra possibilidade seria refletir sobre a direção dos olhares dos personagens e como isso é ca- paz de tornar a expressão de ummais pensativa e de ou- tro mais sedutora. Acontece que, agora, eu também sou uma mediadora e quero propor para você um exercício que vai além da observação técnica e formal. O convite é para imaginar, de forma subjetiva, o que está acontecendo na situação apresentada na imagem. Para isso, tenho algumas per- guntas: qual a relação entre os personagens? Eles estão conversando? Sobre o que é a conversa? Se não estão conversando, sobre o que estão pensando? Qual o con- teúdo da xícara? Por que há vapor envolvendo a figura de cabelo amarelo? Qual a fonte desse vapor? Qual a relação com o vapor que sai da xícara? Você pensa em alguma música quando olha para essa obra? Qual título você daria para ela? Minha expectativa é de que as con- versas iniciadas a partir das obras de Milton Kurtz nunca se esgotem, bem como o nosso interesse e admiração por sua trajetória. Cristina Barros

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