9 Considerar a crítica como o próprio sentido de modernidade, de legitimação dos atribu- tos subjetivos e dissecar, desvelar e vislumbrar a relação entre arte e sociedade e conse- quentemente a relação entre a arte e o seu tempo, é um pressuposto do entendimento das nuances que se colocam sobre o objeto e a ideia, ou seja, entre o trabalho do artista e as razões de ser de seu momento histórico. Desse modo, na tentativa de conduzir o espectador para o interior da obra, a crítica, realizada das mais variadas formas, funda- menta o seu peso simbólico e exalta a magnitude com a qual um artista expressa a sua própria temporalidade. Ela não está no reflexo da obra, mas na reflexão, na contempla- ção compreensiva. No caso de Milton Kurtz (Santa Maria/RS, 1951 - Porto Alegre/RS, 1996), o que se pode pontuar é que o enfraquecimento da crítica nos principais canais de comunicação re- sultou, também, no enfraquecimento da memória, na extensão da distância entre a sua produção e o reconhecimento da grandeza de sua trajetória. Essa ausência torna-se uma caricatura de nosso próprio esquecimento, uma imagem sem identidade que atua como quem destrói o tempo ou ignora a história. Nesse contexto e em contraposição ao des- monte da consciência, reiterar o valor de um artista, por meio da multiplicidade de lei- turas aqui realizadas, é permitir que a investigação dissemine distintas e variadas ideias desse movimento sempre inacabável e doador de significados que é a crítica de arte 1 . É uma permissão para experimentar a obra, para entender a dimensão do outro, sentir o passado e potencializar o presente. Portanto, tendo esse panorama como prerrogativa, o que busca este projeto curatorial, juntamente com a Fundação ECARTA, é revelar este subsequente vazio, é pôr em evidência um artista nacional que luta contra o seu próprio esquecimento. Assim fica para além dessa exposição que homenageia e se compromete com o sen- tido humano das relações que permeiam o meio artístico, um agradecimento especial ao trabalho e à dedicação de Marcelo Oliveira Pereira, responsável pelo acervo de Mário Rõhnelt e Milton Kurtz, e Beatriz lzabel Rõhnelt, mãe de Mário Rõhnelt, que disponibi- lizaram as obras de ambos artistas com intuito de preservar e expandir o universo sim- bólico dos mesmos. Também nos é fundamental o agradecimento e a homenagem à Fundação ECARTA pelos quinze anos completados de dedicação ao meio artístico de forma diversa e ininterrupta, pois são nesses encontros entre curadores, galerias, res- ponsáveis dedicados pelas obras dos artistas e críticos que a evidenciam em suas consi- derações que os projetos adquirem força para unir os sentidos múltiplos da memória e adentrar e preencher as lacunas deixadas pelo tempo. Nicolas Beidacki Walter Karwatzki Curadores Seleção ECARTA 2020 O ESPAÇO VAZIO EM MILTON KURTZ
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