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5 EDUCA SESC 2018 aulas mais aulas. A escola deve ser um lugar onde se trabalha em conjunto o conhecimento. COMO ENTRAM AS INOVAÇÕES TECNOLÓGICAS NESSE CONTEXTO? O debate das tecnologias tem dois aspectos, um que me interessa muito, outro que me interessa pouco. O que me interessa muito é que a revolução digital mudou tudo nas nossas vidas. Mudou a forma como nos relacionamos uns com os outros, como acessamos o conhecimento, como nos relacionamos. Foram mudanças imensas. O filósofo francês Michel Serres, autor de Polegarzinha, sobre a geração que pensa com o polegar, argumenta que a revolução digital foi apenas a terceira grande revolução da História da Humanidade: a primeira foi a invenção da escrita, há cinco mil anos; a segunda foi a invenção do livro impresso, há 500 anos; e a terceira é revolução digital. Em cada uma delas, temos uma relação diferente com o tempo, com a memória, com os outros, uma maneira de comunicar, uma relação diferente com o conteúdo, mas sobretudo aprendemos de maneira diferente antes e depois desses adventos. Por isso, as nossas crianças hoje aprendem de forma diferente do que eu aprendi, que meus pais, avós... Ao mesmo tempo em que as crianças não usam a cabeça da mesma maneira, não processam o conhecimento da mesma maneira, não utilizam as mesmas zonas do cérebro que a nossa geração. Elas constroem e reconstroem o conhecimento de outra forma. Têm uma maneira completamente distinta de comunicar, e a educação não pode deixar de perceber isso. Ela tem que ser coerente com essas novas gerações, em termos de perceber que podemos aproveitar o seu potencial para construir uma educação contemporânea. Há um potencial imenso, elas passam 24 horas por dia escrevendo no smartphone. Escrevem mais em um dia do que meus avós escreveram a vida toda. Não escrevem poesia ou literatura, eu sei. Escrevem com erros, eu sei. Escrevem com aquelas figurinhas horríveis, eu sei. Mas o potencial para a comunicação está lá. Compete a nós, professores, transformarmos isso em uma lógica da aprendizagem daquilo que entendemos que é importante os alunos aprenderem. Nessa dimensão da revolução digital o conhecimento sobre as novas tecnologias interessa muito porque elas são imprescindíveis. Já um pensamento sobre as novas tecnologias em uma perspectiva instrumental, se deve utilizar ou não, parece um debate irrelevante. Desse ponto de vista, é a mesma coisa que uma caneta, um papel, um livro, que uma biblioteca. Não parece um debate que mereça se passar muitas horas discutindo. Sobre as consequências da revolução digital certamente que sim. QUAL É O GRANDE DESAFIO DOS EDUCADORES? Serem capazes de construir novos ambientes educativos. Parece muito simples, mas para construir isso toda a estrutura da escola é colocada em pauta: da organização do espaço e do tempo, da distribuição dos serviços e do trabalho dos professores. É sobretudo a ideia de que precisamos trabalhar coletivamente. Não há espaço para o trabalho individual. A ideia do professor que trabalha individualmente – eu vou organizar muito bem as minhas aulas e dar muito bem as aulas para meus alunos – não existe mais. Se eu quero ser um professor responsável e competente, não tenho que me questionar sobre como eu vou organizar as minhas aulas para os meus alunos, mas como vou trabalhar commeus colegas professores para organizarmos um espaço que permita aos alunos sua aprendizagem e seu trabalho. É uma mudança radical da função do professor. É um tempo da metamorfose da escola, e essa mudança da forma ocorreu pela última vez emmeados do século 19. Há 200 anos. Nossa geração é a que vai promover a metamorfose da escola e o trabalho do professor vai ser totalmente reconfigurado em função disso. O professor deve pensar sempre como equipe a organização do espaço pedagógico para que seus alunos trabalhem e estudem. Esse é ponto. Aliás, é o que acontecia antes de existir escola. Havia estudo, mas não aulas. Acho que vamos ter que voltar a essa ideia. O importante é estudar, trabalhar, pesquisar, desenvolver projetos e resolver problemas a partir de determinados temas de investigação. Isto que é verdadeiramente essencial. Eu insisto nisso porque eu acho que, no Brasil, isto por vezes está mal compreendido. E dizer isso não é desvalorizar o conhecimento, pelo contrário, é dizer que o núcleo central é sempre o conhecimento. EM TEMPOS EM QUE TUDO QUE SE BUSCA PARECE QUE JÁ ESTÁ PRONTO NA INTERNET, COMO FAZER PARA ENSINAR A PENSAR? Tivemos nos últimos 200 anos uma estrutura curricular baseada essencialmente em disciplinas, organizadas no século 19. Do ponto de vista científico também, todo o movimento positivista que hoje conhecemos estruturou suas disciplinas no século 19: matemática, física, história, geografia etc. Primeiro na ciência e só depois foi para dentro do currículo escolar, que é uma reprodução simplificada da estrutura científica, tal como ela se consagrou no final do século 19. Essa ideia hoje não faz sentido, nem na ciência e nem na escola. O que faz sentido é um desdobramento em duas linhas de frente: o aprender as linguagens – e João Castro

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