Revista Sesc Arte e Educação 2024
acadêmico brasileiro, mesmo sendo discutido desde os anos de 1990, ain- da enfrenta alguns desafios, sendo muitas vezes taxada de inconsisten- te ou privada do rigor científico ne- cessário. Para Melina Scialom e Cia- ne Fernandes (2018, p. 8), “a inclusão de um trabalho de arte como meio e produto de pesquisa émuito comum, mas a validação desta prática em si mesma como produtora de conheci- mento permanece em questão” . Sustentamos, neste trabalho, por- tanto, o contrário: buscamos estabe- lecer relações com modos de pes- quisar pelos quais a criação artística pudesse ser pesquisa e a pesquisa, arte. A partir da Prática como Pesqui- sa, demarcamos a vivência e a expe- riência artística como o próprio mé- todo investigativo, uma vez que, para Ciane Fernandes et al. (2018, p. 7) “colocar a prática artística no centro da pesquisa é a condição mesma da PaR, a prática conduz o processo” . Procuramos estabelecer, em nossas aulas, um tipo de fazer te- atral que assumisse, intensificasse e ampliasse a dimensão das rela- ções e coletividades nos processos educativos, com base no respeito, na ética, no cuidado, no diálogo e na confiança. Percebemos que, em relação ao teatro na sala de aula, podemos fazer mais coisas em grupo, como lançar-se no ar e não se esborrachar no chão ao ser am- parado pelos colegas. Estar aberto ao encontro teatral é estar aberto ao mistério do outro em um difícil exercício de alteridade que implica uma atitude ética e política. Nosso fazer coletivo não signifi- cou harmonia absoluta e nem bus- cava tal equilíbrio, pois a convivên- cia é uma zona instável, visto que as relações são eventos delicados e também são zonas de disputas. O desafio foi descobrir maneiras de negociar com as fragilidades, ne- cessidades, sensibilidades e proble- mas de nós mesmos e dos demais, em uma dinâmica de equilíbrio em meio aos movimentos coletivos. Considerações Finais: Construímos nossas cenas eman- cipatórias no cotidiano. Pequenas fagulhas, como quando em encon- tros e práticas educativas teatrais, pudemos acionar olhares e sensa- ções diferenciados em relação aos nossos corpos e aos corpos dos ou- tros. Exercícios de respiração, jogos teatrais que nos provocavam a estar no aqui e agora de maneira presen- te e diferente da cotidiana, de forma a dar atenção àquilo que não é per- cebido pela agitação diária e a alta quantidade de informações que re- cebemos diariamente. Não foi nos- so interesse medir ou quantificar o que foi ou não emancipatório para o grupo, mas percebemos que ali aconteciam práticas de conheci- mento dos nossos corpos e formas de cuidado de si e do coletivo, prá- ticas essas que muitas vezes estão distantes de nós, mas que foram importantes momentos nas aulas, quando puderam nos mostrar um possível diferente daquilo já conhe- cido por nós. Praticar teatro com adolescentes demarcou um território significativo para o grupo do presente trabalho, o que levou a observar alguns des- locamentos e aberturas nas intera- ções que esse grupo realizou em relação ao seu modo de agir prévio às aulas de teatro. Temos em men- te que tais práticas não escolares possibilitaram ao grupo entender as formas como percebem e atuam REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS FERNANDES, Ciane; LACERDA, Cláudio Marcelo Carneiro Leão; SASTRE, Cibele; SCIALOM, Melina. A arte do movimento na prática como pesquisa. In X Congresso da ABRACE, 2018, Natal. Anais do X Congresso da ABRACE. v. 19, n. 1, p.1-24, 2018. Disponível em: https:// encurtador.com.br/jRktM. Acesso em: 10 set. 2024. FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. 17. ed. São Paulo: Paz e Terra, 1987. VIANNA, Arthur Ferreira; SIRINO, Márcio Bernardino; MOTA, Patricia Flávia. Para além da significação ‘formal’, ‘não formal’ e ‘informal’ na educação brasileira. Educação, v. 8, n. 3, p. 584-596, 2020. Disponível em: https://periodicos.set.edu . br/educacao/article/view/7736. Acesso em: 23 ago. 2024. WIERSBITZKI, Patricia da Silva. Possibilidades de nós: teatro, educação e cenas emancipatórias. 2023. Dissertação (Mestrado em Educação) – Programa de Pós-graduação, Universidade Estadual do Rio Grande do Sul, Osório, 2023. Disponível em: https://repositorio.uergs . edu.br/xmlui/handle/123456789/3078. Acesso em: 02 set. 2024. diante das situações provocadas pelo jogo teatral, as novas sensa- ções e pensamentos que produzem sobre si e sobre o outro, as rever- berações positivas que foram refor- çadas verbalmente, nos momentos de partilha das experiências, nos diálogos, nas escritas e em outras formas de expressão. Na pesquisa concluída, esse território de aber- turas geradas pelo encontro entre adolescentes e o Teatro do Oprimi- do é o que tratamos como possí- veis cenas de emancipação. 19 Revista Sesc de Arte Educação vol.4 2024
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